Este livro é um livro sobre transformações. O movimento tomado como tema das pesquisas aqui comunicadas é o da formação do psiquismo humano, destacando a unidade entre ensino – aprendizagem e desenvolvimento psíquico. A referência teórica é a psicologia histórico-cultural, partindo do princípio, inerente a esse sistema, de que a educação e o ensino promovem o desenvolvimento do psiquismo; o eixo articulador das produções que compõem esta coletânea é a preocupação prática de atuar na formação humana. Nesse sentido, a dimensão pedagógica se faz presente direta ou indiretamente, pois não é possível analisar o psiquismo humano em toda a sua complexidade e atuar no sentido da formação da atividade consciente sem considerar os conteúdos históricos necessários para desenvolver a pessoa e os meios didáticos para socializar conhecimentos e atitudes humanas. Como se trata do psiquismo na particularidade do humano, as produções tomam como objeto a consciência em desenvolvimento – ou, mais precisamente, a atividade consciente em formação na sua relação com a realidade histórica. A consciência não é compreendida como ‘objeto’ estático, mas como a forma humana de relação com a realidade; desse modo, entende-se que o desenvolvimento da atividade consciente na vida individual se produz como unidade composta de momentos qualitativamente distintos que vão compondo e requalificando a relação com a realidade. Em que pese a existência, na formação da atividade consciente, de momentos em que dimensões particulares do psiquismo ganham destaque, ora ligadas às funções cognitivas ora às dimensões afetivas, o psiquismo é tomado nesta obra como sistema interfuncional que integra como totalidade os momentos afetivos e cognitivos, produzindo imagem mediadora da relação da pessoa com o real. Considerando essa posição, a subjetividade humana somente pode ser compreendida de modo concreto a partir da prática social, tendo a categoria ‘atividade’ como central na análise da consciência humana em formação. A psicologia histórico-cultural pontua que nas relações sociais relacionam-se em uma mesma dinâmica a atividade social e a atividade pessoal, tratando-se de duas dimensões de uma mesma ‘atividade’ que se encontram em movimento. Desloca os estudos do psiquismo humano das posições subjetivistas, ligadas ao idealismo, e mecanicistas, próprias do materialismo vulgar, para bases históricas sociais. A organização das reflexões expostas neste livro, destacando os períodos do desenvolvimento psicológico, estrutura-se pela categoria atividade. As atividades sociais se sucedem como mediações que exigem do psiquismo individual novas conquistas, forjando a consciência mais complexa e elaborada. A reflexão sobre periodização do desenvolvimento psíquico trata do movimento em direção à consciência que não apenas reflete o mundo, mas também o transforma criativamente. Essa análise compõe a tarefa educativa de inserir o indivíduo criticamente na vida social. No processo de investigação e de colocação de problemas práticos, são as formas conscientes mais complexas e desenvolvidas que organizam a teoria da periodização do desenvolvimento na psicologia histórico-cultural, o que não significa desconsiderar as particularidades dos momentos iniciais da vida individual que se organizam a partir de imagens elementares e imediatas. A relação consciente com a realidade é tomada como desafio ao ser humano histórico e conquista individual, possível somente como resultado de um longo processo de superação do imediato sensorial e perceptivo pela relação teórica com a realidade. O horizonte do conjunto dos capítulos não é apenas a consciência por si mesma, mas a prática ciente de si e das contradições da realidade. O vínculo teórico com a realidade representa a implicação com o mundo a partir das mediações culturais que se expressam em sistemas conceituais sobre os objetos e fenômenos da realidade natural, social e do pensamento. Os estudos aqui comunicados contribuem com a análise do difícil processo de decifrar o mundo a partir do pensamento, tomando como tarefa cultivar a consciência pessoal pela socialização das conquistas históricas do ser humano. Nesse sentido, o problema da periodização do psiquismo humano e a prática educativa se implicam com questões referentes aos conteúdos a serem ensinados e aprendidos para a formação da consciência que tenha como referência a luta prática pela emancipação humana. A posição metodológica de conhecer para transformar organiza a psicologia histórico-cultural e confere unidade aos artigos propostos para esta coletânea. O livro está organizado a partir de 15 estudos que analisam e problematizam os desafios educativos da formação humana. Sua leitura integral permite refletir sobre o complexo desafio de compreender o desenvolvimento do psiquismo e demonstra que conquistas particulares em distintos momentos da vida transformam-se em fundamento para conquistas posteriores, evidenciando a importância da educação sistemática para a história dos estudantes, na medida em que o sistema educativo posicione-se pela socialização da relação teórica com a realidade. O material foi organizado como unidade estruturada em uma sequência que contempla a primeira infância, a infância, a adolescência e o jovem adulto. As pesquisas relatadas analisam em profundidade esses momentos particulares do desenvolvimento psíquico apontando para possibilidades do trabalho prático dos profissionais envolvidos com esses momentos específicos do processo educativo. Mesmo considerando a importância da unidade do livro, reconhecemos que os capítulos ganham ainda mais sentido para esses profissionais, visto que no tratamento dado a cada período do desenvolvimento destacam-se as regularidades do funcionamento psíquico da idade analisada e os problemas práticos enfrentados pelos trabalhadores da educação nas circunstâncias da escola atual. A obra foi organizada segundo a lógica da teoria geral do desenvolvimento psíquico, mas não se omite da necessária articulação com a periodização pedagógica inerente ao sistema educacional atual, problematizando limites e possibilidades entre o já teorizado na psicologia histórico-cultural e a dinâmica da realidade concreta da sociedade de classes. O material, a partir de estudos singulares, dialoga com a prática inerente à educação infantil, ensino fundamental, ensino médio e formação universitária de adultos jovens. Os artigos são compostos por análises teóricas de aprofundamento da compreensão da psicologia histórico-cultural, revisões bibliográficas e pesquisas teórico-práticas orientadas pelo desafio de educar humanamente. Como se trata de um livro sobre transformações, os autores sistematicamente destacam os momentos de crise que se expressam na vida individual como regularidade histórico-social, produzidas pela participação ativa do indivíduo nas atividades sociais. Elas são consideradas indícios de transformações revolucionárias (qualitativas) na relação do indivíduo com a realidade social. Esses momentos de ruptura e transição culminam em transformações que modificam não apenas o que se pensa e sente em relação ao mundo material e social, mas fundamentalmente transformam os modos de ser e agir sobre a realidade. Não por acaso o problema do processo de personalização aparece com regularidade nos estudos, e, mesmo quando não desenvolvido em profundidade, a categoria personalidade é destacada no sentido de comunicar aos leitores que as mudanças quantitativas e pontuais que ocorrem a partir da educação e do ensino se acumulam e transformam a pessoa como totalidade. O processo da formação humana é compreendido como movimento que necessariamente passa pela tomada de consciência de si e do mundo, mas que supera a dimensão subjetiva do problema para revelar a objetividade das atitudes da pessoa frente ao mundo e a si mesma. Em síntese, os artigos articulam de modo original o sistema categorial atividade – consciência – personalidade, sublinhando a educação e o ensino no processo de formação humana. No esteio da discussão sobre a complexidade da formação da pessoa pela mediação do ensino sistemático, alguns estudos destacaram a importância da pedagogia de orientação materialista histórico-dialética. O trabalho educativo na perspectiva da Pedagogia Histórico-Crítica toma como tarefa identificar conhecimentos críticos que promovem o desenvolvimento no sentido da emancipação humana e considera os meios de socialização dos conhecimentos visando superar apropriações ‘verbalistas’ do conhecimento em direção às transformações catárticas dos estudantes. Os autores da coletânea defrontam-se com o problema da didática e não tergiversam sobre a tarefa de transformar os princípios metodológicos do materialismo histórico-dialético em prática educativa. O manejo com as questões didáticas, que refletem o fazer diário da educação, indica possibilidades profícuas de articulações entre os estudos sobre a periodização do desenvolvimento com o método da pedagogia histórico-crítica, indicando perspectivas na construção histórica de uma didática que organize e operacionalize a formação da atividade consciente e que coloque em destaque a socialização da ciência, da arte e da filosofia nas ações que compõem as aulas. Vislumbra-se a possibilidade de que cada encontro humano e cada aula sejam transformados em relações sociais críticas à alienação humana. O momento atual do problema é de construção coletiva. Participam desse processo 36 pesquisadores que compõem a produção deste livro e que decidiram enfrentar o desafio como trabalhadores da educação comprometidos com a emancipação humana. As análises sobre o psiquismo humano são tomadas pela perspectiva do processo educativo sistemático, vislumbrando a construção de um sistema que possa socializar a relação consciente com a realidade para o conjunto dos indivíduos. Mesmo que essa possibilidade não se realize de forma plena na sociedade alienada, ela continua a existir enquanto houver disputas nesse sentido no campo da educação. Os estudos posicionam-se na luta pela humanização e na crítica sistemática da realidade alienadora, partindo da referência de que a consciência coletiva, produzida histórica e culturalmente, somente pode realizar-se como prática de emancipação humana quando socializada como consciência pessoal para o conjunto da sociedade, superando a desigualdade de classes. Enfim, este livro representa um movimento político que se posiciona pela transformação da sociedade em direção a uma sociabilidade que se oriente pelo bem comum. A obra é de interesse de psicólogos, pedagogos, estudantes e educadores de modo geral, mas, fundamentalmente, destina-se àqueles que são militantes das causas humanas. Livro destinado às pessoas inquietas que identificam nos obstáculos sociais produzidos, intencionalmente ou não, o real impedimento para que a ‘riqueza’ humana se faça presente na vida do conjunto das pessoas. Material para aqueles que não se conformam com a apropriação privada do conhecimento e seus resultados, visto que produzem uma circunstância histórica na qual a maioria das pessoas vivem alienadas da consciência social, dificultando o entendimento do mundo e de si próprias na história.